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Doutor Machado – o Direito na vida e na obra de Machado de Assis

  • Foto do escritor: Guilherme Salgado
    Guilherme Salgado
  • 27 de fev. de 2021
  • 3 min de leitura

Livro de Cássio Schubsky e Miguel Matos (Editora Lettera.doc e Migalhas, São Paulo, 2008)


Dos nove romances que Machado escreveu, em seis os protagonistas eram bacharéis em Direito.


Cássio Schubsky, advogado e historiador, faleceu aos 45 anos, de infarto, a 8 de fevereiro de 2011.


Um de seus livros mais importantes foi Estado de Direito Já – Os trinta anos da Carta aos Brasileiros, obra sobre o documento (redigido em 1977) que iniciou o processo de transição para a democracia, após o regime militar. Entrevistou o idealizador da Carta e um dos ícones do Direito brasileiro, Gofredo da Silva Telles Júnior.



Na apresentação de Doutor Machado, os autores afirmam que “Machado nos une, o Direito nos une, e de repente percebemos que o Direito em Machado nos une também”.


Em 375 páginas decidiram “dividir” responsabilidades: Cássio fez uma leitura crítica dos romances de Machado de Assis, destacando os personagens jurídicos, e Miguel Matos propôs uma antologia completa em sua vida e obra.


Cássio acrescentou que Machado abandonou um texto “carola e bem comportado para atirar-se com ímpeto a criações ímpias e sarcásticas”. Citou dois exemplos: Memórias Póstumas de Brás Cubas e a novela O Alienista.


À página 277, trecho do conto O Alienista fala mais diretamente aos moradores desta terra, que tem tudo para voltar a ser chamada Manchester Mineira: “Um dia, conseguiu meter na Casa Verde o juiz de fora; mas procedia com tantos escrúpulos, que o não fez senão depois de estudar minuciosamente todos os seus atos...”.

(primeira observação: Casa Verde era o hospício do lugar; segunda: o itálico e o negrito de juiz de fora são de responsabilidade deste escrevinhador).


A partir da página 265 estão os contos de Machado, nos quais inclui-se O Alienista.


Um dos mais curiosos, sem dúvida, é o intitulado Suje­-se gordo!, publicado na íntegra no livro Doutor Machado (um conto curto).


Dois amigos conversam no intervalo de uma peça, A Sentença ou o Tribunal do Júri, e um deles decide relatar as experiências reais com o Tribunal do Júri. Na primeira experiência, uma pessoa estava sendo acusada de desviar algum pequeno valor de uma instituição bancária. Como as provas não eram convincentes, um dos jurados pensou em absolvê-lo, a que um homem ruivo e corpulento afirmou que “seria um ato de fraqueza se o absolvêssemos... Quer sujar-se? Suje-se gordo”. No dia seguinte leu o nome dos jurados nos jornais, incluindo o do ruivo, Lopes. A expressão facial havia ficado em sua memória...


Percebam o absurdo: não se deve desviar “pequenos valores”, mas “sujar-se gordo".


Chamado a participar de outro júri, anos depois, qual não foi sua surpresa ao ver o nome do réu: Antônio do Carmo Ribeiro Lopes, o mesmo que havia sido jurado anos antes.


Foi absolvido, findos os debates, acusado de desviar considerável quantia do Banco do Trabalho Honrado, com provas muito mais convincentes.


Esse grande mestre foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras.


Capítulo Oitavo


Um dos capítulos do livro Doutor Machado se intitula Um advogado enigmático, e trata do “maior enigma da literatura brasileira”, resolvido hoje com um simples exame de paternidade: Capitu teria traído Bentinho, gerando Ezequiel, um filho bastardo, com Escobar, amigo do marido? Ou não?


A semelhança física entre Ezequiel, filho de Capitu, e Escobar, o amigo, talvez não passasse do resultado da imaginação de Bentinho. Mas Bentinho estava “vigiado” pelo ciúme doentio da mulher, sua namorada desde a adolescência. E ele percebia semelhanças nos gestos e traços entre o menino e o amigo.


Escobar morre em um desastre em alto-mar, Capitu fica inteiramente desolada, e Bentinho enxerga nisso a perda do suposto amante.


Machado não atesta a traição, apenas a insinua.


Cássio alertou que advogar, no século XIX, mesmo na capital do Império, era atividade reduzida a algumas dezenas de profissionais, com poucos advogados de destaque, grande parte mal remunerada, frequentemente retratados na obra de Machado.


 
 
 

1 commentaire


rogerio
27 févr. 2021

Adorei a resenha!

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