ROBINHO, SUA MÃE, SEU IRMÃO. MAS SEM RACISMO!
- Guilherme Salgado
- 1 de fev. de 2021
- 3 min de leitura

Basta de pré-conceitos, nada de pré-julgamentos. O samba, a capoeira, os ritos das religiões de matriz africana, o rap...
Manifestações da arte da periferia originários, “coincidentemente”, da cultura negra. As religiões de matriz africana, é bom que se diga, continuam sendo alvo de perseguições.
Chutava-se e chuta-se a imagem de Nossa Senhora Aparecida, negra também.
A pichação, do mesmo modo, é arte da periferia, de quem foge da PM.
De quem se esgueira em vielas e becos.
Arte de quem corre para não ser apanhado.
E apanhar.
Quando foi chamado, Robinho não hesitou um segundo. Já tinha até o nome: “Deus é mãe”, homenagem à própria mãe, Josefa Santana , a Zefa, e ao irmão Roberto, no colo de Zefa.
Pensou no desenho, desenhou o desenho, imaginou como ficaria com cores, rostos, roupas... Afinal, seriam 2 mil metros quadrados de área a ser pintada.
Uma enorme empena (vivendo e aprendendo) no Centro de Belo Horizonte. Rua Tupis esquina com Afonso Pena, na bela capital dos mineiros.
O trabalho artístico demorou 12 dias.
Não se poderia supor que a obra de arte passaria a ser alvo de um inquérito policial. Deu até no Jornal Nacional.
E não só a empena pintada por Robinho. Há outra empena em BH, a pintura de uma figura negra, da artista plástica Criola (assim mesmo, sem o “u”), igualmente alvo de uma contestação judicial.
Logo depois da crônica está o texto da CURA – Circuito Urbano de Arte, condenando o “cunho racista” da perseguição.
E se convidasse, para pintar com ele, a turma que picha em BH? Afinal, eles fazem parte da cidade. A arte faz parte da cidade. E a caligrafia do picho é arte.
Ninguém recusou: Poter, Lmb, Bani, Tek e Zoto se juntaram.
Ontem, em conversa aqui com estas crônicas, identificamo-nos imediatamente. Robinho é filho do inenarrável deputado federal Vicente Paulo da Silva, o Vicentinho. Tenho a honra de assinalar em meu parco currículo: assessor de imprensa da CUT, no final dos anos 90, sob a presidência do Vicentinho.
Robinho foi aluno de Design Gráfico do professor Tadeu Costa, na Universidade Anhembi. Mora na Bela Vista, em São Paulo, e é da edição 2020 do Projeto CURA.
Disse Robinho: “o Brasil é um país muito conservador, mas chegar a esse ponto é impensável”.
Impensável, Robinho, impensável.
Documento/postagem do CURA
Nós, organizadoras do CURA - Circuito Urbano de Arte, e mais cinco artistas convidados da edição 2020, fomos incluídos criminalmente em inquérito da Polícia Civil que investiga a ocorrência de crime contra o meio ambiente.
O motivo: a presença da estética do picho em uma das empenas da coleção do festival CURA. Se condenados, podemos todos pegar até quatro anos de prisão. A obra “criminosa”, segundo a Polícia Civil, é o maior mural em empena do Brasil, criado pelo artista Robinho Santana (Diadema/SP), na quinta edição do festival, em 2020.
A obra de arte contou com a colaboração dos artistas de BH Poter, Lmb, Bani, Tek e Zoto, a convite do CURA e do artista Robinho. Os convidados fizeram uma intervenção artística na obra utilizando caligrafia na estética do picho. O mural "Deus é mãe", de quase 2000m2, já se tornou patrimônio da cidade. A imagem da mãe negra carregando um filho no colo e levando o outro pelas mãos emociona quem passa pelo hipercentro, e é o novo cartão-postal da cidade, local clássico de fotografia de diversas famílias.
O painel saiu ovacionado nas principais mídias nacionais. O vídeo que mostra a intervenção dos artistas convidados, exibindo detalhes da caligrafia com o trecho de música do rapper mineiro Djonga, tem quase 2 milhões de visualizações. É notório o reconhecimento artístico da obra e seu sucesso. Entendemos que esse processo é uma investigação ILEGAL e RACISTA, que CRIMINALIZA ARTISTAS PERIFÉRICOS e a própria ARTE URBANA, e quer determinar ARBITRARIAMENTE O QUE É OU NÃO É ARTE.
O inquérito acontece num contexto de perseguição desproporcional aos pichadores na cidade de Belo Horizonte, dentro de um cenário de cerceamento de liberdades constitucionais no âmbito nacional.
Não aceitaremos a tentativa de criminalizar os artistas.
Não aceitaremos a tentativa de criminalizar o festival.
Não aceitaremos os ataques racistas à obra “Deus é mãe”.
Entramos com pedido no Judiciário para obter o trancamento da investigação.
Neste dia de N. S. dos Navegantes e de Iemanjá, na convivência pacífica e linda de duas matrizes religiosas, só posso deixar aqui meu abraço fraterno de total solidariedade à arte de Robinho e seus parceiros.
NÃO ACEITAREMOS ! ! !