Um relato sem ódio, sem rancor. Primo Levi em "É isto um homem?"
- Guilherme Salgado
- 24 de mar. de 2021
- 2 min de leitura

Atendendo a uma infinidade de pedidos – cartas, bilhetes, mesmo ameaças do que se diz presidente, assembleias, gente batendo aqui na porta, achei melhor manter estas crônicas uma vez por semana, às quartas. Pode ser?
Escrevo às 13h30 de quarta, 24 de março. Tentando, a todo custo, não me deixar influenciar pelas auspiciosas notícias que chegam de Brasília (finalmente!!!), quero redigir três ou quatro linhas sobre o livro É isto um homem?, de Primo Levi. E deixarei de lado a discussão sobre sua morte: causas naturais ou suicídio?
Nasceu em Turim, na Itália, em 1919, e formou-se na Faculdade de Química de sua cidade antes de as leis fascistas impedirem aos judeus o acesso aos estudos superiores.
A formação em Química, algum tempo depois, já em Auschwitz, o livraria da morte...
Preso pela polícia fascista a 13 de dezembro de 1943, na Itália, com 24 anos, “pouco juízo”, ligado ao Movimento Giustizia e Libertá, foi mais tarde enviado a um campo de concentração.
E as memórias desse período descreve com uma maestria... qual adjetivo?... maestria inenarrável.
Sem rancor, sem ódio.
Um relato.
Dele próprio e de seus companheiros de tragédia, de dor.
Babel de fome, doenças, sede e abandono. E medo, muito medo.
Foi mandado inicialmente a Fóssoli, ainda na Itália, em que eram reunidas as pessoas “não gratas ao governo fascista republicano”.
E depois à Polônia: a Monowitz, perto de Auschwitz, e depois a Auschwitz. ARBEIT MACHT FREI – o trabalho liberta, frase acima do portão de entrada: o trabalho liberta. Liberta como? “Essa lembrança ainda hoje me atormenta nos sonhos”, sentencia.
Mas era o limiar do inferno. A irrealidade.
Não demorou a aprender que era um Häftling, número 174.517, tatuado no braço esquerdo. “Fomos batizados, levaremos até a morte essa marca”. Häftling - preso, prisioneiro.
À página 152, da edição da Rocco (não traz o ano, mas é de depois do Acordo), Primo Levi ressalta:
“Hoje – neste hoje verdadeiro, enquanto estou sentado frente a uma mesa, escrevendo, hoje eu mesmo não estou certo de que esses fatos tenham realmente acontecido”.
Nunca perdeu a esperança, entretanto. Até ser “libertado”, em janeiro de 1945.
Domingo, 28 de março: dia do Revisor. Saúde, Guilhermão!!!
É magnífico ler de um ser humano que viveu tudo aquilo sobre a esperança que tem!!!